sábado, 4 de maio de 2013

Dos limites dos braços

Sempre foi uma discussão o fato do "não riso". E quando eu não conseguir fazer rir? E se ninguém rir das minhas piadas? Um dos vários desesperos do palhaço. Ah, se fizer uma piada e ninguém achar graça, faz do sem graça uma coisa com graça. Easier said than done, mas ok.

Mas e o choro? Como o palhaço reage diante do choro?
Quando tem um bebêzinho fazendo acesso? Gritando com uma dor que nem ele nem ninguém sabe dimensionar? O doutor-palhaço atrevido vai até lá. Se por sorte, consegue de alguma forma diminuir o choro. Na real? Não faz a dor desaparecer, ajuda a suportá-la. E se pudesse? Mudava a cena em um minuto. Deitava naquela maca, estendia o braço pra enfermeira, deixava ela enfiar aquela agulha do tamanho de uma régua, e colocava o bebê na sua frente só para poder admirá-lo enquanto ele olha a sala-mundo que existe ao seu redor. Onde tudo é digno do olhar. Onde tudo é digno de observação. Se pudesse, nunca deixava ninguém espetar bebê nenhum. Mas o palhaço não pode.

E quando tem uma mãe chorando pela doença da filha? Chorando por lembrar da morte de entes queridos? Chorando ali, na sua frente, dizendo que não sabe como aguentar? O que o palhaço atrevido faz? Abraça. Faz carinho. Escuta. Canta. Fica ali. Mas se pudesse? Fazia construir um forte tão forte que nada abalaria sua estrutura. Juntava toda a esperança do palhaço e de palhaços conhecidos e colocava dentro de uma caixa bem brilhosa e bem bonita só para ela lembrar que apesar de tudo ainda existe. E, principal, fazia o tempo andar bem rápido pro diagnóstico ser descoberto, o remédio fazer efeito e a recuperação concluir. E não existiria outra alternativa. Todo mundo ficaria bem. Mãe, filha e palhaço. Mas o palhaço não pode.

Os braços do abraço do palhaço são pequenos e não conseguem abarcar toda a dimensão da dor, do sofrimento, tão únicos, tão intensos de cada um que tá ali. Ele tenta. Mas são pequenos demais.
E dentro da grandeza da sua pequenez ele abraça. Forte. O máximo que consegue. E tenta pegar um pouco da dor que tá ali. Pelo menos pra tentar dividir um pouco. Pelo menos pra ajudar a suportar.
E continua... porque a vida é assim.


Dra Nyna

3 comentários:

Lise disse...

Isso tudo é muito grande que chega a dar uns negócio na barriga. Obrigada, Esmeraldina, por compartilhar tanto carYnho em suas palavras. Obrigada Y por fazer a gente enxergar com olhos de ver. Por acender o amor tantas e tantas vezes e uma vez mais. Amor mortal. Amor que transcende. Amor imortal. Amor que encerra, ou não? Amor que recomeça... porque a vida é assim.

Guilherme M. disse...

Lindo o texto.

A Elvira Wuo diz em sua dissertação que o palhaço acelera o tempo dos pacientes, como se a criança fosse teletransportada para um universo paralelo de sonhos e brincadeiras, e sem notar, já está mais próximo da próxima dose do remédio e da recuperação plena.

Cada palhaço abraça a hercúlea tarefa de co-criador desse universo paralelo, junto da criança. Isso é tão belo e grandioso que acho que se houvessem mais palhaços, e assim mais universos, todo o desejo exposto no teu texto acabaria realizado!

RebYs disse...

Lindo...